quarta-feira, julho 29, 2009

passarinha

vida despregada
de seus matizes
despluma sua
embriaguez

como prisioneira
no papel

verte a noite
num espelho
opaco

raiz que é
em si precipício
e funambula
na bamba linha
da beira do asfalto

ave de verso
recolhe-se
de seu destino
a cada todo dia

ave que sorve
o corpo do sonho

e grita num mudo
instante
de uma mirada

sexta-feira, julho 24, 2009

coisas do querer

tempos imperativos
um miado mais agudo
e zás

vem, doninha, chega logo
pro meu sorriso se alargar

mas o ponteiro das horas
se tarda:
e a chave nunca gira
me trazendo a moça amiga


vem, doninha, chega logo
pro meu sorriso se alargar

a espera me põe sobressaltos
as compensações restam
como abrigo

o vinho que talha
o leite para avinagrar
as maçãs se vestem de cobre
as roupas dançam
ao vento do varal
até já cansaram de secar

e a música
sempre recomeçando
pinta de ladainha o meu canto
põe as tristezas no meu carnaval

são tantas vontades
os verbos querendo exigir
mas só há
um único ponto de fuga:
a moça é
o mapa pra me apaziguar

vem, doninha, chega logo
pro meu sorriso se alargar

sexta-feira, julho 10, 2009

circular

do ciclo, do que nem os oráculos nos precisam clarividenciar: a paixão é reincidente e renova-se, tão logo se abra o peito para ela respirar. sempre me encantou a ideia de permanecer renovadamente imantada a um veio, a um amor: planta, bicho, água, alguma gente. aprendi menina a ser a velhinha mais companheira de meu avô, e a paixão era todo dia, mesmo quando com cara de abuso.
hoje experimentei, como sorvete de novidade que arregala os olhos e paladar, língua gelada e cócegas felizes: Rafa e Lelo. Uma brincadeira boba de "bunda pra cima, titia morde"; de procurar camarões daquela cor que a gente não vê, "descoloridos, sabe, tia?"; de dar banho seco nas porquinhas-da-índia (e eles nem conhecem Bandeira ainda, vou levar pra eles um dia). Relógio novo, acertar a hora e o dia, rever a cumplicidade e as rememorações de um menino de oito anos; de outro de quatro, muito falante e muito sedutor. Laços que não se desfazem, à revelia de qualquer movimento do mundo que gire ao avesso.
sorriso largo e dia repleto. peito aberto ao que de melhor me vem do páthos.